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quinta-feira, 23 de abril de 2020

Universo ou Multiverso?

Boa noite,
A perspetiva cósmica é o espelho supremo da nossa insignificância.
             Quantas vezes, em longas viagens de avião, ao observar à distância a magnificência de todas aquelas montanhas, rios ou desertos, ficámos assoberbados com a grandeza e magnitude do nosso planeta Terra? Seguramente, muitas. Permitam-me, todavia, assinalar que, na grande ordem cósmica, o planeta Terra, citando Carl Sagan, não passa de um mero “pálido ponto azul”.


Ao longo dos séculos, sucessivas descobertas cósmicas foram, reiterada e repetidamente, despromovendo a nossa auto-imagem. Durante séculos, a Terra era considerada singular do ponto de vista astronómico, até os astrónomos descobrirem que era simplesmente um outro planeta em órbita do Sol. 
Depois pensámos que o Sol era uma estrela única. Estávamos errados mais uma vez. Numa fase ulterior, pensámos que a Via Láctea constituía todo o Universo conhecido, até que, por via de dados observacionais, inferimos e verificámos a existência de cerca de 200 mil milhões de galáxias espalhadas pelo Universo observável.
Hoje, como é fácil presumir que existe apenas um Universo. Todavia, a improbabilidade continuamente reafirmada de algo ser único e a profusão de modernas teorias da cosmologia, exigem que continuemos abertos à maior afronta ao nosso argumento de exclusividade: o multiverso.

             Cumpre, neste âmbito, colocar uma pergunta: advogar a existência de universos paralelos ao nosso será científico? Afinal, com a tecnologia atual, é impossível reunir quaisquer evidências empíricas e observacionais que apontem para a existência de outros universos. 
             O multiverso talvez não seja uma teoria científica válida na aceção supramencionada. Mas é seguramente uma hipótese cosmológica, alicerçada numa evidência teórica fundamental e numa perspetiva lógica da realidade, para além do contributo de uma teoria importante: a Teoria das Cordas.


1. Inflação eterna


             A teoria do Big Bang deixa de fora algo muito importante:o Bang. Revela como o universo progrediu após o Bang. Todavia, não esclarece sobre o que teria forçado o Bang. Esta lacuna foi aparentemente colmatada por uma versão atualizada da teoria do Big Bang- cosmologia inflacionária. O modelo de inflação eterna de Alan Guth e Andrei Linde preconiza que o combustível da inflação inicial prova ser tão eficiente que é virtualmente impossível usá-lo todo. Isto significa que na teoria inflacionária, o Big Bang que desencadeou o nosso universo não é único. Muito pelo contrário. Prevê-se que esse combustível é tão eficiente que não gerou apenas o nosso Big Bang como também poderia ter gerado incontáveis outros Big Bangs. Cada Big Bang, despoletaria o início do seu próprio universo separado. 
             Por inerência, o nosso universo seria apenas um ponto, uma bolha numa estrutura incomensurável, infinito de universos paralelos, cada um com uma diferente constante cosmológica e diferentes leis da Física. Este processo repete-se indefinidamente, ad infinitum.


Foto: Alan Guth e Andrei Linde



2. Princípio de Copérnico


             Subjacente a esta questão do multiverso parece estar, concomitantemente, uma reflexão sobre o próprio contexto da nossa existência.
             Quando examinamos as forças do nosso universo, reparamos que este parece especialmente “afinadas” e propensas ao desenvolvimento de vida inteligente. Basta pensar que se a força nuclear fosse ligeiramente mais fraca, o Sol teria ardido há milhares de milhões de anos. O mesmo se aplica à força da gravidade. Se fosse um pouco mais forte, o Universo teria colapsado sobre si mesmo há milhares de milhões de anos. Este nível de ajuste é transversal a toda a constituição do Universo. Parece que o Cosmos reúne as condições peculiares para propiciar uma vida tão peculiar como a nossa. 
Mas, seremos assim tão especiais?




             Na resposta a esta questão, imperam dois princípios com possibilidades um tanto divergentes. Os defensores acérrimos do Princípio Antrópico advogam que o nosso Universo é tão especial justamente porque foi criado por Deus. Deus, enquanto força primária e criadora concebeu um universo ajustado à nossa existência.
             Como seria de esperar, este argumento tem encontrado resistência. Muitos dos proponentes da teoria do Multiverso, apostam as suas fichas no Princípio de Copérnico. Advogam que a peculiaridade do nosso Universo não é especial mas antes inevitável. Supondo que existe um número infinito de universos, cada um com diferentes leis da física, vivemos no universo que , num espetro infinito de possibilidades, é o mais apropriado à nossa existência.
             A nossa existência, segundo este princípio, deve-se não à sorte ou graça de um Criador, mas antes a uma inevitabilidade algébrica.
             Atualmente, avaliar cientificamente esta possibilidade é simplesmente inexequível, impossível.
Veremos o que a perspetiva cósmica do futuro nos reserva.

Obrigado,
Miguel Carvalho


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